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Parceiro histórico da mídia alternativa brasileira, Iroel Sánchez faleceu na quinta-feira, 18 de maio, aos 58 anos de idade, em Havana. A partida física do dirigente cultural, jornalista, analista político, escritor, editor, realizador audiovisual e intelectual provocou comoção e homenagens em Cuba e também no Brasil.

“Iroel Sánchez se tornou um amigo do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé desde a sua fundação, em maio de 2010”, explica Altamiro Borges, coordenador da entidade que reúne diversos segmentos da sociedade - movimentos sociais, acadêmicos, comunicadores e lideranças políticas - na luta pela democratização da comunicação no país.

“Como comunicador e editor do site La Pupila Insomne, ele veio ao Brasil e participou de várias atividades organizadas pela entidade, como no histórico Encontro Mundial de Blogueiros, realizado 2011, em Foz do Iguaçu, Paraná”, recorda Miro. Ele também participou de encontros de blogueiros em São Paulo e na Bahia, além do Seminário Mídia e Democracia nas Américas, promovido pelo Barão de Itararé em 2015, discutindo a experiência da Revolução Cubana no enfrentamento ao bloqueio informativo e ao cerco midiático que a mídia hegemônica global exerce, até hoje, contra Cuba.

Iroel Sánchez, o primeiro da direita para a esquerda, em evento promovido pelo Barão de Itararé, em São Paulo, no ano de 2015.

“Ele sempre nos ajudou a entender o papel do imperialismo ianque e de suas mídias e agências de manipulação e dominação”, relata Miro. “Ele também nos ajudou a entender os desafios da Revolução Cubana e a luta de ideias na heroica ilha. A última vez que estive com ele foi num seminário sobre guerra cibernética e o cibererativismo digital em Havana. Além dos debates, pude conviver com sua família em um jantar que varou a madrugada, regado a muita reflexão, muitas risadas e várias doses de rum. Iroel deixa uma enorme saudade. Fará muita falta".

O intelectual cubano foi alçado à vida política a partir de sua atuação como estudante e dirigente da União de Jovens Comunistas. A partir daí, começou a construir frentes importantes na cultura e na comunicação: fundou editoras, programas de televisão e para as redes sociais, além de ter sido membro da União de Jornalistas, Escritores e Artistas de Cuba. Foi, também, uma dos grandes colaboradores da TeleSur.

Integrante da coordenação do Barão de Itararé durante os 13 anos da entidade e atualmente coordenadora do Comitê Gestor da Internet no Brasil, Renata Mielli também se pronunciou sobre o tema. “Estive com Iroel em março deste ano, durante o encontro Pátria, em Havana, que reuniu dezenas de militantes para discutir os desafios para a comunicação diante de um mundo mediado por gigantes da economia capitalista”, conta. “Foi uma alegria encontrá-lo. Um camarada sempre muito caloroso, atencioso e amigo do nosso Barão de Itararé. Suas intervenções no encontro trouxeram aspectos importantes para a luta atual. E entusiasmo. Porque o Iroel era um entusiasta da luta política em defesa do socialismo. Sua partida é uma perda enorme para todos nós”.

Editor da Revista Fórum, Renato Rovai avalia que, com Iroel, parte um pedaço importante da luta pela democratização da informação na América Latina, mas que ficam seus ensinamentos. “Iroel foi antes de mais nada um grande amigo que eu ganhei na militância da blogosfera. Um querido, um humanista, um intelectual poderoso e humilde, uma companhia muito mais que agradável, luminosa. Eu e Dri tivemos a oportunidade de passar um dia inteiro andando por Havana Vieja com ele e recebendo seus ensinamentos sobre José Marti, Fidel e a revolução. Foi uma das aulas mais preciosas que tive na minha vida. Nunca esquecerei. Parte um pedaço da luta latinoamericana na defesa da democratização das comunicações no planeta, mas ficam semeadas suas lições. Salve, Iroel. Que sempre estará presente”.

Jornalista e também membro da coordenação do Barão de Itararé, Rodrigo Vianna contou passagens de sua visita a Cuba cerca de uma década atrás. “Muito triste com a partida de Iroel, que me recebeu em Havana há uns 10 anos. Jantamos na casa da mãe dele,uma casa daquelas antigas. Morava outra família na frente. “Toquei a campainha e veio uma mulher com a toalha enrolada na cabeça, parecia um filme de Pedro Almodóvar. Era a vizinha. O marido veio atrás e queria saber quem era aquele cara batendo à porta. Aí apareceram Iroel e a mãe. Duas figuras. A casa dela tinha entrada pelo pátio lateral. Na sala da casa, um retrato gigante de Fidel Castro. Conversamos profundamente madrugada adentro. Rodamos muito por Havana e até dei camisas do Brasil para os filhos dele. Muito triste com seu falecimento”.

Iroel em Foz do Iguaçu

No artigo intitulado "Sem coincidências em Foz do Iguaçu" ("Sin casualidades en Foz de Iguazú"), publicado no portal CubAhora e em seu blog, no dia 3 de novembro de 2011, Iroel compartilhou suas impressões sobre o evento realizado pelo Barão de Itararé. Vale a pena conferir alguns trechos:

"É madrugada na sala de espera do aeroporto de Foz do Iguaçu e um estande de venda de livros me chama a atenção. Entre os best-sellers do momento, incluindo duas biografias de Steve Jobs, um livro com capa tipográfica - letras negras sobre fundo vermelho - ocupam o lugar mais destacado. Seu título: "Os últimos soldados da guerra fria", de Fernando Morais. Entre o nome da obra e do autor, uma oração anuncia o tema: 'A história dos agentes infiltrados por Cuba em organizações de extrema-direita nos Estados Unidos'. Me sinto sortudo. Um exemplo do livro de Morais viaja em minha bagagem na volta ao meu país.

(...) O que percebi nos intercâmbios entre os mais de 400 participantes reunidos nas imediações da hidrelétrica de Itaipu foi um estado de rebelião global contra os monopólios midiáticos.

(...) No fim, o evento, além de condenar as ações dos Estados Unidos contra Cuba por limitar seu acesso à Internet, também apontava como primeira de suas prioridades 'a luta pela liberdade de expressão, que não deve ser confundida com a ideia de liberdade propagada pelos monopólios midiáticos, que castram pluralidade informativa.

(...) Olho o livro de Fernando Morais sobre 'Os Cinco' e leio em sua sinopse: 'uma trama transobrdante jamais revelada pela imprensa'. E penso que nada é mera coincidência neste mundo no qual, como reza o título de um bom livro, o jornalismo é notícia”.

Repercussão em Cuba e além

Presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel Bermúdez manifestou luto em suas redes sociais: "A Revolução Cubana perde um filho que consagrou a ela e ao ideal socialista até suas últimas energias. Como intelectual incansável, Iroel Sánchez deixa uma grande e valiosa obra, um modelo de revolucionário total".

Responsável pela comunicação do movimento político espanhol Izquierda Unida, Caros Gonzáles Penalva publicou artigo no qual afirma que “a vida de Iroel Sánchez é a de um explorador de nosso tempo. Um defensor apaixonado da classe trabalhadora, com um acúmulo histórico de conhecimentos enciclopédicos e uma memória com capacidade de análise meticulosamente organizada. A realidade mutante do nosso tempo nunca conseguiu desequilibar seu sólido núcleo ideológico, intelectual e moral”.

“Existem flores teimosas e firmes que não deixam nunca de combater. No passado 18 de maio perdemos uma delas em Cuba. Não tenho nem forças para falar dele no passado: Iroel Sánchez”, escreveu Pascual Serrano, que também participou do Encontro Mundial de Blogueiros em Foz do Iguaçu, promovido pelo Barão, em 2011.

Fundador do Rebelión no ano de 1996, o jornalista e escritor espanhol deu o seguinte depoimento: “Nos conhecemos há 20 anos, em Oviedo, no meu país. Desde então, com sua vitalidade, me arrastava a todos os seus projetos: a Feira do Livro de Havana; a revista La Jiribilla; EcuRed; La Pupila Insomne… me arrastava e a qualquer um que se aproximasse dele. Ou seja, o que se entende por um bom combatente: a pessoa que luta e consegue transmitir força a todos ao seu redor”.

“Com Iroel”, complementa Serrano, “estive na Espanha, em Caracas, em Mar del Plata, no Saara. Em todos os lugares, a todas as horas, em todas as circunstâncias, ele estava lutando incansavelmente pela Revolução, por justiça, pelo socialismo e pela verdade. Com Iroel, você se sentia como remando rumo ao horizonte da utopia. Esse barco, agora, perde impulso. Por isso devemos remar mais forte. Prometemos a ele seguir avançando e só assim mostraremos que ele segue entre nós”.

Pascual Serrano, o segundo da esquerda para a direita, no Encontro Mundial de Blogueiros, em Foz do Iguaçu.

 

A publicação desta matéria é uma homenagem ao amigo Iroel Sánchez e seu legado, que segue presente em nossa luta como fonte de inspiração. Iroel, presente!

Presidente defendia a estruturação de uma rede de comunicação para “barrar as manipulações dos traficantes da dependência, as especulações dos promotores de negócios duvidosos e os planos apressados e vorazes dos trustes internacionais”

O governo do general Juan José Torres foi um marco na história boliviana e da América Latina para romper com as amarras do imperialismo. Apesar da curta duração da sua gestão presidencial - de 7 de outubro de 1970 até 21 de agosto de 1971 - derrubada pela oligarquia a serviço dos Estados Unidos, nos deixou frutíferos ensinamentos, expressos no livro “Em defesa de minha nação oprimida”.

Leonardo Wexell Severo

Torres encarava a mídia como imprescindível na batalha de ideias, seja nos campos político, econômico e cultural. Daí a razão de ter investido tanto na construção de meios próprios - como o jornal “El Nacional” -, não só para dar sustentação às medidas do governo revolucionário, mas contribuir, diariamente, para a formação de uma geração cada vez mais consciente. E independente.

Por demonstrar uma indissolúvel unidade entre palavra e ação, deixou como patrimônio, “medidas concretas convertidas em realidade irrefutável”, descreveu sua esposa e companheira, Emma Obleas de Torres. Estão aí, citou Emma, a “intervenção nas instalações da Bolívia Gulf Oil Company e entrega das mesmas à Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB); nacionalização da Mina Matilde; reposição salarial dos mineiros; reversão das concessões da empresa petrolífera Bolivian Atlantic Corporation; expulsão do ‘Corpo de Paz’ americano - usado para esterilizar mulheres -; respeito exemplar às garantias e direitos humanos, libertação de todos os presos políticos; ampliação do orçamento das universidades e do setor educacional; apoio à formação da Assembleia Popular; projeto de restauração do estado de direito, com nova Constituição assegurando uma ampla participação, capaz de garantir a continuidade do processo de libertação nacional”. 

Há poucos dias, o jornalista brasileiro Paulo Cannabrava Filho, então responsável pelo El Nacional, voltou à Bolívia depois de 52 anos. Graças à dedicação e ao compromisso da Fundação Flavio Machicado Viscarra, reviu os valiosos exemplares do jornal. Tudo gravado pelo cinegrafista argentino Andrés Sal.Ari, que logo converterá os preciosos momentos em um documentário. Em 1970, Cannabrava entrou com Torres no Palácio Presidencial.

Em tempos sombrios de fake news, em que a podridão do bolsonarismo persiste como chaga em setores doentios da sociedade, ecoa o alerta de Torres sobre a relevância da informação para a consolidação da unidade, bem como da “vigilância que devemos sustentar e redobrar”. Afinal, “a reação não abandona o campo de luta sem esgotar todos os recursos que dispõe para manter sua sobrevivência política”. 

Derrotados nas urnas, insistem na uniformidade do discurso, já que os grandes jornais e sites, bem como as emissoras de rádio e televisão no Brasil continuam sendo monopólio de uma casta contra os interesses da sociedade. E aí temos o canto de sereia de neoliberais e entreguistas sobre a importância da “responsabilidade fiscal”, do Banco Central “independente”, dos ditames de Washington, das privatizações/desnacionalizações, que apoiaram na presidência um propagandista de armas contra os livros, da contaminação contra as florestas e índios, da doença contra a vacina.

Neste momento em que a Pátria e a Humanidade se levantam contra a irracionalidade imperialista, precisamos atuar de forma consciente, unida e coordenada para alterar a “correlação de forças”. Sem a compreensão exata de que a correlação é uma condicionante de nossa atuação, mas nunca uma determinante, nos reduziríamos a ser meros espectadores do nosso fracasso e, consequentemente, do projeto de emancipação sonhado por Tiradentes e Bolívar. Apequenaríamos nossa existência a de seres conformistas, intimidados e acovardados - no melhor dos casos - quando não de vulgares colaboracionistas, sempre dispostos a negociar corações e mentes em troca de qualquer migalha oferecida pelo opressor.

Contra a alienação, é chegada a hora de informação e formação!

Boa leitura!

 

Leonardo Severo, repórter do HP e integrante da ComunicaSul, e Paulo Cannabrava Filho, responsável pelo El Nacional, com a primeira edição do jornal: estatização da indústria de açúcar.

“Nossa força e firmeza no governo emana da vigilância consistente e incansável das massas populares, vigilância que devemos manter e redobrar porque a reação não abandona o campo de luta sem esgotar todos os recursos de que dispõe para manter sua sobrevivência política”, afirmou o presidente general Juan José Torres, esclarecendo que a revolução boliviana estava “ocorrendo simultaneamente em todas as frentes”. “A luta do povo é econômica, é social, é política, é cultural, é militar”, alertava, frisando que “os inimigos da pátria não deveriam encontrar nenhuma trincheira aberta, pois esse seria o calcanhar de Aquiles para a sua permanência”.

Daí a necessidade do investimento na informação, assinalava, pois não se pode permitir “as manipulações dos traficantes da dependência, as especulações dos promotores de negócios duvidosos, e os planos apressados ​​e vorazes dos trustes internacionais”, que buscam a todo custo fazer recuar a roda da história em prol “da oligarquia financeira, importadora, bancária e mineira”. 

A mídia elitista, argumentou o general, se caracterizava pela “falta de identificação com o nosso povo” e era guiada para “alcançar uma sociedade típica de consumo, tendo como base a criação de necessidades artificiais”, de “comodidades supérfluas”, enquanto havia bolivianos padecendo na “ignorância, no morticínio e na miséria”. “A propaganda se converte em um poderoso instrumento de distorção de valores”, advertia o presidente, denunciando “a ânsia de introduzir nos hábitos de consumo os últimos modelos automáticos que os mecanismos publicitários associam à ideia de necessidade”.

“A libertação nacional é uma consciência do povo boliviano que, por isso mesmo, deve se manter informado de tudo o que está sendo feito na linha de frente da ação e da luta patriótica”

Na avaliação do general, “a libertação nacional é uma consciência do povo boliviano que, por isso mesmo, deve se manter informado de tudo o que está sendo feito na linha de frente da ação e da luta patriótica”. “Nenhum cidadão deve ficar à margem dos problemas do país e a voz das aspirações populares deve chegar a todos os lares, não só para calar os boatos da campanha interna, que os monopólios e a reação nacional espalharam, mas também para incentivar a educação e a cultura em todas as ordens de pensamento e ação social”, enfatizou.

Por conta disso, exemplificou, “a rádio Illimani, emissora estatal, desempenhou um papel fundamental na história revolucionária do último 7 de outubro, demonstrando que se colocou definitivamente ao lado do povo, reunindo seus desejos e levando o alcance do processo revolucionário até os confins da pátria e do exterior”. O presidente ressaltou que naqueles dramáticos dias, “a emissora do Estado se converteu em porta-voz dos patriotas frente aos desígnios dos agentes da dependência” e “neutralizou a ação da propaganda reacionária que queria acabar com o movimento das maiorias nacionais”. Continuando a transmitir o trabalho libertador do governo, assinalou, “o preconceito que conspira contra todos os meios de comunicação estatais foi superado”, fazendo com que a rádio se colocasse entre as maiores de todo o país.

“O mesmo trabalho tem sido feito pela televisão boliviana que, à medida que seus programas melhoram, tem uma audiência crescente porque serve ao povo não só como meio de divulgação de informação, mas também como instrumento de educação artística e cultural. Atualmente, estão sendo dados os primeiros passos para uma nova ampliação de suas perspectivas, englobando também uma tarefa de orientação política”, destacou.

"El Nacional: jornal que dirige as massas"

Em suas intervenções, o líder elogiou o papel do jornal El Nacional, que “tornou-se uma trincheira de defesa do processo revolucionário e um meio de orientação política das massas e do povo boliviano”. Em inúmeras ocasiões, citou Torres, “esclareceu problemas e substituiu a verdade histórica diante das acusações interesseiras feitas ao governo e ao processo de libertação nacional”. “As páginas editoriais do El Nacional contêm o mais completo material de opinião e orientação de todos os jornais publicados no país”, declarou o presidente, lembrando que o órgão não competia com os demais no volume de vendas, “mas no patamar de jornal que dirige as massas”.

Segundo Torres, ao ver as palavras nacionalização, estatização, planificação, valorização dos salários e direitos nas manchetes, “a direita reacionária exumou de seus depósitos as bandeiras do anticomunismo e a impaciência extremista deu-lhe as justificativas para a sua campanha”. 

“Uma camarilha de políticos deslocados e um grupo de soldados subornados se reuniram nos porões da CIA para tramar o complô que me tirou do poder”

“Uma camarilha de políticos deslocados e um grupo de soldados subornados se reuniram nos porões da CIA para tramar o complô que me tirou do poder após três dias de luta sórdida, sangrenta e desigual”, recordou Torres. Assim, sem que tivesse tempo de consolidar seu projeto nacional-desenvolvimentista, o presidente foi deposto em meio a um banho de sangue promovido pelo psicopata Hugo Banzer.

A partir de 1974, a chamada “Operação Condor”, uma forma de integração regional das forças repressivas, perseguiu e executou líderes políticos populares e anti-imperialistas. Inúmeros presidentes latino-americanos foram depostos ou eliminados fisicamente, em uma etapa marcada pela forte ingerência externa dos Estados Unidos.

Profundamente humanista, Juan José Torres foi assassinado com os olhos vendados e três tiros na cabeça em 1976 pela Triple A (Aliança Anticomunista Argentina), esquadrão da morte treinado e patrocinado pelo imperialismo, quando tratava de retornar à Bolívia e construir uma ampla frente cívico-militar de libertação nacional.

O anúncio da compra do Twitter pelo bilionário norte-americano Elon Musk trouxe um misto de tristeza e revolta para quem luta contra as fake news e uma alegria incontida para a extrema-direita em todo o mundo. Mas é preciso uma análise que vá além da dicotomia e dos 280 caracteres.

A partir das declarações do próprio Elon Musk surgem pelo menos algumas motivações para a compra e uma provável mudança na curadoria de conteúdo dessa plataforma.

Por Renata Mielli* e Gustavo Alves**

Esse pressuposto é fundamental para entender porque um bilionário que não tem nenhuma atuação nas plataformas de tecnologia resolveu investir US$ 43 bilhões numa empresa avaliada em pouco mais de US$ 38 bilhões e que no ano passado registrou um prejuízo líquido de US$ 221 milhões.

A primeira constatação é que ele comprou a empresa para acabar com o pouco de conquistas que a sociedade obteve no processo recente de pressão para que as Big Techs desenvolvessem algum contrapeso para reduzir a disseminação de desinformação e discurso de ódio.

Isso escamoteado pelo argumento da defesa fundamentalista da “liberdade de expressão”, vista como um direito absoluto e que inclusive se sobrepõe a outros direitos. Mas é preciso enfrentar essa retórica oportunista e não ficar na defensiva para afirmar que não existem direitos absolutos, que estabelecer limites para o exercício desta liberdade é tão fundamental quanto a sua própria existência. Não cabe na liberdade de expressão, por exemplo, racismo, homofobia, apologia à morte ou aniquilação de grupos sociais, discursos que atentem contra a vida. Nada disso é opinião que possa ser livremente expressada. Nem em espaços privados como círculos de amigos ou familiares, muito menos em ambientes nos quais se realiza o debate público, como no caso das Plataformas de Redes Sociais.

Por isso, quem defende - como Musk, que o Twitter e outras plataformas sejam "arenas livres", na prática estão colocando em risco as poucas conquistas que a sociedade conseguiu avançar no debate sobre a necessidade de haver mais regras sobre a atividade dessas plataformas, como o reconhecimento tímido do papel deletério da amplificação algorítmica pelas plataformas.

Sob pressão da sociedade, o Twitter patrocinou um estudo para entender qual a possibilidade de seu algoritmo valorizar ou impulsionar uma determinada ideologia política e embora o Twitter tenha divulgado as descobertas da pesquisa em outubro de 2021, só agora o estudo foi publicado na revista PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences, publicação oficial da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos), após ter sido revisado por outros cientistas.

O estudo analisou uma amostra de 4% de todos os usuários do Twitter que foram expostos ao algoritmo (mais de 46 milhões) e também analisou um grupo de controle de 11 milhões de usuários que nunca receberam tweets recomendados automaticamente em sua timeline.

A face visível da ação do algoritmo do Twitter é a exposição entre as postagens das contas que você segue, tweets marcados como “você pode gostar”.  Ou seja, o algoritmo está recomendando conteúdo para você.

Isso é feito usando os dados da sua atividade anterior na plataforma, como os tweets que você curtiu ou retuitou. Uma equação estatística aplicada a estes dados lastreia o “aprendizado de máquina”. Assim o computador, em tese, aprende automaticamente com as preferências do usuário e aplica isso a dados que o sistema não viu antes.

Mas existe um fantasma presente nessas equações: o viés. Que segundo esse estudo reforça preconceitos humanos e amplificou os discursos de “direita”.

O estudo analisou o efeito de “amplificação algorítmica” em tweets de 3.634 políticos eleitos de sete países com grande base de usuários no Twitter: EUA, Japão, Reino Unido, França, Espanha, Canadá e Alemanha.

A pesquisa mostrou que em seis dos sete países (a Alemanha foi a exceção), o algoritmo favoreceu significativamente a amplificação de tweets de fontes politicamente inclinadas à direita.

No Canadá por exemplo, os tweets dos liberais foram amplificados em 43%, contra os dos conservadores em 167% e no Reino Unido os tweets dos trabalhistas foram amplificados em 112%, enquanto os conservadores foram amplificados em 176%.

Outro aspecto revelado pelo estudo foi amplificação algorítmica de notícias políticas. O estudo analisou a amplificação algorítmica de 6,2 milhões de notícias políticas compartilhadas nos EUA. E chegou à conclusão que a amplificação das notícias também segue o mesmo padrão.

Ou seja, há uma exposição maior dos conteúdos de direita, fake news e desinformação. 

Esse estudo só foi realizado graças a intensa cobrança da sociedade e após a tentativa de invasão do Congresso americano pela turba fascista alimentada por Trump.

Pois bem, quando se começa a vislumbrar a chance de se entender como os algoritmos alimentam a disseminação de desinformação e discurso de ódio, eis que surge Elon Musk.

Musk é mais um expoente dos fundamentalistas da liberdade de expressão. Para ele, não deve haver limites, o que significa que não deve haver qualquer tipo de moderação sobre o que se diz nas redes sociais. Outro defensor dessa tese é o presidente Bolsonaro.

Segundo Musk, ele quer transformar o Twitter numa "arena de livre discurso".

Ele afirma que irá democratizar o Twitter apostando na abertura do código fonte (a programação interna do Twitter) para que os mecanismos de operação sejam conhecidos e explorados por programadores.

Uma promessa vazia cheirando a “Ouro de Tolo” feita pela mesma pessoa que usou sua conta para atacar pessoas transgêneros e as políticas de combate à transmissão da Covid-19.

A liberdade de expressão tem sido usada - de forma tão indevida, oportunista e equivocada - por expoentes da extrema direita, bilionários e representantes do grande capital. A economia atual é dinamizada pelo modelo de negócios que usa o discurso como mobilizador da atenção.

E o que chama mais atenção é o discurso de ódio, é o preconceito, é a polarização social baseada em grupos que se comportam como torcedores raivosos e não como cidadãos que discutem temas de interesse público e social.

Somos todos sugados pela força centrípeta dos estímulos incessantes provocados pelas redes de alienação e agimos como autômatos reproduzindo, curtindo, compartilhando conteúdos que reforçam a visão do meu “time”, grupo e dos meus pré-conceitos.

Nesse processo, monetizamos toda a economia assentada nas plataformas. Vendemos nosso olhar, nosso corpo e alma e compramos produtos, serviços e ideias, sem qualquer reflexão. Ajudamos a curto circuitar a esfera pública e a desintegrar qualquer possibilidade democrática.

O princípio da inimputabilidade do intermediário, tão importante para o ecossistema da internet, não pode ser confundido com ausência de compromisso e responsabilidade das plataformas com o debate público.

Por isso, a regulação das plataformas de rede sociais, das Big Techs, a partir de amplo debate público é urgente e indispensável. Musk comprou o Twitter, e pode conduzir esta rede a ser um ambiente de afronta a direitos humanos fundamentais e de menosprezo com a democracia.

Mais do que nunca devemos retomar o debate sobre o #PL2630 e reforçar nele todos os elementos que dizem respeito diretamente as obrigações e regras para que as Big Techs atuem no Brasil.

É mais urgente do que nunca que tenhamos uma legislação que regule as atividades desta e de outras plataformas no Brasil, que as obrigue a cumprir os compromissos expressos em nossa Carta Constitucional. O dinheiro pode comprar quase tudo, mas não podemos deixar que ele compre também nossa soberania, a proteção à nossa democracia e esfera pública.

*Renata Mielli – Jornalista, Doutoranda no Programa de Ciências da Comunicação da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (PPGCOM-ECA-USP), integrante da Coalizão Direitos na Rede.

**Gustavo Alves – Jornalista, webdesigner e programador, estudante de Ciência de Dados na USP/Esalq.

Em fase final de debate na Câmara dos Deputados, o PL 2630/2020, que acabou apelidado de PL das Fake News, sofre onda de ataques com conteúdos de desinformação. Facebook, Google e cia temem a aprovação de medidas que vão impor transparência às suas atividades e outras regras para a sua atuação no país.

Desde que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, reiterou que o tema é prioridade na agenda de deliberações da Casa, as empresas resolveram subir o tom e partir para o vale tudo, na tentativa de alterar ou até impedir a aprovação da proposta. As empresas usam o seu poder de mercado, e espaços privilegiados de suas plataformas para fazer a campanha contra um projeto de lei no país, o que é gravíssimo! 

Mas o que elas temem? O que as desagrada tanto?

Por Renata Mielli*

Medo da regulação

Nos anos 90, início dos anos 2000, prevalecia uma visão ufanista de que a internet representaria um mundo de liberdade, de que ela seria um território livre: livre de regulação do estado, livre de fronteiras, livre de regras, onde todos podem construir seus negócios, suas formas de comunicação e expressão. 

Essa ideia de ausência de regras foi muito conveniente para o poder econômico que se ergueu no Vale do Silício. As grandes empresas de tecnologia (Big Techs) se apropriaram desse discurso para impulsionar seus modelos de negócios e erigir um novo mercado monopolista dominado pelas empresas Gafam, acrônimo para Google, Amazon, Facebook e Apple e Microsoft.

A partir do escândalo Cambridge Analityca, das denúncias da sociedade civil e do alerta de pesquisadores muitos países passaram a discutir legislações para regular essas empresas. Há debates sobre obrigações de transparência, regras para moderação de conteúdos, combate ao discurso de ódio, enfrentamento à desinformação, debates sobre direito autoral e medidas econômicas e tributárias.

Em todos os países que enfrentaram essa agenda, as Big Techs usaram seu poder para tentar impedir que leis fossem aprovadas e aplicadas. Fizeram de tudo: campanhas baseadas em distorção de informações e dados, e até ameaças de deixar de ofertar seus serviços. Isso aconteceu na Austrália, na Espanha, na França e estão acontecendo agora no Brasil.

Em 03 de março, o Facebook veiculou propaganda em jornais de grande circulação nacional com o título: O PL das Fake News deveria combater Fake News. E não a lanchonete do seu bairro. No dia 11, foi a vez do Google soltar uma nota dizendo que se aprovado, o PL vai modificar a internet como você conhece. No dia 14, o Google colocou na sua página inicial, um link para a nota, de forma que todos os usuários que fizeram uma busca neste dia entraram em contato com a visão alarmista da empresa sobre o projeto. Além disso, passou a circular conteúdo publicitário do Google em outras plataformas com o mesmo conteúdo, que utiliza a retórica do medo, mecanismo largamente usado para estruturar conteúdos de desinformação e manipular a opinião pública.

Sobre o que trata o PL 2630

Afinal, será que o PL 2630 vai prejudicar a lanchonete do seu bairro? Será que ele vai mudar a internet que a gente conhece? Para responder essas perguntas, sem adjetivos, temos que conhecer o que de fato diz o projeto, que está sendo discutido desde maio de 2020.

Ele ganhou o apelido de PL de Fake News no início de sua tramitação. Na sua primeira versão, havia um artigo que tentava conceituar desinformação, que sofreu muitas críticas por trazer riscos à liberdade de expressão: definir numa lei que conteúdo seria classificado como fake News ou não é muito perigoso. Por isso, este ponto acabou caindo, e o texto que aguarda votação no plenário da Câmara não traz, em nenhum dos seus 42 artigos, o termo fake news.

Então, qual o escopo do projeto e porque ele continuou sendo chamado de PL de Fake News? O PL 2630 dispõe sobre a criação de uma Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. Com base neste tripé, estrutura um elenco de obrigações, regras e mecanismos de governança para enfrentar o abuso do poder econômico nas redes, permitindo aos cidadãos e aos órgãos públicos identificar conteúdos de publicidade e impulsionados, saber o montante e a origem de recursos usados, por exemplo, para impulsionar conteúdos pregando o inexistente tratamento precoce contra a Covid-19 que tantos prejuízos trouxeram e ainda trazem à saúde.

O fenômeno da desinformação e seu impacto atual está relacionado às dinâmicas de circulação da informação no interior das plataformas. Ganham alcance e velocidade graças aos fatores de relevância considerados pelos algoritmos. Essas empresas, praticamente não fornecem dados sobre, por exemplo, quantos conteúdos são excluídos, com quais critérios, e porque contas são suspensas. Quantos dos que estão lendo este artigo já tiveram postagens excluídas ou rotuladas sem maiores explicações? E pior, os canais de contestação disponíveis para que possamos recorrer são praticamente inexistentes. Enquanto isso, muitas autoridades e pessoas com mandatos eletivos usam seus perfis e contas para espalhar a desinformação impunemente.

Ou seja, o que o projeto tenta é obrigar as Big Techs que prestam serviços para centenas de milhões de brasileiros prestem informações para que a sociedade compreenda como as fake news circulam e são patrocinadas, o que é fundamental para adotar medidas para combatê-las.

Outro ponto fundamental é uma seção inteiramente destinada a estabelecer responsabilidade diferenciada a agentes e contas de interesse público no uso das redes sociais. Afinal, quanto maior o poder que uma pessoa tem, maior a responsabilidade que ela carrega.

Também traz artigos para conter a viralização das fake news nos serviços de mensagem instantânea – aplicações do tipo WhatsApp e Telegram. Estabelece vedações à utilização de disparo automatizado de mensagens em massa, como as que foram largamente utilizadas na campanha de Jair Bolsonaro em 2018 e denunciadas pela jornalista Patrícia Campos Mello.

Ou seja, o projeto não proíbe publicidade nem impulsionamento, apenas cria regras para que a transparência seja possível. Nesse sentido, não há nada no PL que prejudique a lanchonete. Também não haverá uma mudança na internet que você conhece. Inclusive porque o PL não abrange toda a internet, ele se aplica apenas aos provedores de aplicação com mais de 10 milhões de usuários. Mas ele vai obrigar, sim, uma mudança da postura dessas empresas com relação aos usuários brasileiros. Mudanças que trarão mais segurança e empoderamento do usuário e da sociedade. E é isso que elas querem evitar.

As Big Techs se colocam veementemente contra transparência porque a opacidade é um fator intrínseco ao seu modelo de negócios das Big Techs. Dar transparência às suas operações é empoderar a sociedade para reduzir assimetrias provocadas pelo poder dessas empresas. Elas querem continuar ganhando bilhões de reais no país, atuando sem qualquer regra, sem ter que prestar contas e informações de suas atividades e, em alguns casos, nem responder às autoridades nacionais.

Amplo debate

O projeto 2630 está em debate na Câmara desde agosto de 2020. Ao longo desses quase dois anos de debate, foram organizados por iniciativa do atual relator, Dep. Orlando Silva, dois seminários, com a participação de centenas de especialistas. Organizações da sociedade civil, entidades acadêmicas, empresariais realizaram inúmeros eventos sobre o PL. O tema foi tratado ao longo deste período na mídia especializada, mas também em veículos jornalísticos. Ou seja, houve um amplo debate que resultou num aprofundamento de muitos dispositivos e amadurecimento do que é a espinha dorsal do projeto. A ofensiva atual das Big Techs nesta reta final é justamente uma reação a isso.

Há aspectos a serem melhorados e aperfeiçoados no projeto. Claro que sim. Um deles diz respeito ao artigo 38, que cria uma obrigação de remuneração de conteúdo jornalístico por parte das plataformas. Esse é um tema que não alcançou uma convergência maior. Vários setores, inclusive que têm posições diferentes sobre o PL, manifestam reservas com relação a esse dispositivo. Mas os motivos que geram resistência são distintos. As Big Techs têm se colocado contra qualquer iniciativa que surja na perspectiva de remunerar links. Inclusive ameaçaram acabar com sua operação em outros países (Austrália, Espanha por exemplo). Já, entidades do campo jornalístico, da mídia alternativa e dos direitos digitais que questionam esse tópico não o fazem por serem contra o debate em si, mas porque consideram que esta é uma discussão que precisa ser feita em outro contexto. Ela diz respeito a questões delicadas como definir o que é ou não conteúdo jornalístico, quem ao final tomaria essa decisão, como se daria essa remuneração, quem teria direito a ela, etc. Então, esse de fato é um tema sensível, para o qual ainda se busca alternativa melhor.

Mas essas melhorias e outras que ainda possam ser feitas no projeto precisam ser construídas a partir de um debate leal.

O que é importante que a sociedade compreenda é que após dois anos de debate, o projeto amealhou muitos consensos progressivos. Consenso visto não como unanimidade, mas construção de posição comum, principalmente em torno dos dispositivos envolvendo transparência, publicidade, desenho de um procedimento mais transparente sobre medidas de moderação com direito à contestação, para garantir um ambiente mais seguro e menos tóxico nas redes. E, claro, por se tratar de um tema de fronteira, dinâmico, há algumas questões que ainda ensejam dúvidas. O que precisa ser visto com naturalidade.

É fundamental desfazer as confusões que a campanha de desinformação das empresas estão trazendo. É preciso seguirmos atentos às discussões nas próximas semanas. E ter a tranquilidade de que essa lei é um dos passos que a sociedade brasileira dá na perspectiva de regular a atividade das plataformas e coibir a disseminação da desinformação. Outras leis certamente virão. E há também muitas iniciativas que precisam ser tomadas fora do âmbito legislativo. O que não podemos é ficarmos paralisados. Essas empresas não podem fazer terrorismo midiático e espalhar desinformação para continuar atuando numa terra sem lei.

*Renata Mielli é jornalista, doutoranda em Ciências da Comunicação pela ECA/USP, coordenadora do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e integra a Coalizão Direitos na Rede.

SAMBA DE DANDARA NO MÊS DAS MULHERES | Grupo composto exclusivamente por mulheres e que tem o objetivo de exaltar as grandes sambistas, compositoras e intérpretes, o Samba de Dandara será a atração musical do evento gastronômico e cultural que acontece neste domingo (26/3), das 12h às 14h, na Praça Memorial Vladimir Herzog, no bairro da Bela Vista, em São Paulo.

No cardápio, o prato árabe mjadra (arroz, letilha e cebola frita), preparado nas panelas da chef Norma Abi Harb. 

Intitulada "Todo mundo tem que falar (e comer)", a atividade acontece todo último domingo do mês e ofecere almoço aos participantes a preços módicos ou gratuitamente, sob o mote "quem pode paga, quem não pode pega". A cada edição, completam a programação exposições fotográficas e artísticas, venda e lançamentos de livros. 

A iniciativa é do Centro Cultural Elifas Andreato, com o apoio do SEESP - Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo e diversas entidades parceiras.

A praça fica próxima à Rua Santo Antônio, 33, em frente ao Terminal Bandeira, atrás da Câmara Municipal.

#PraçaVladimirHerzog #CentroCulturalElifasAndreato #SambadeDandara #NormaAbiHarb


Elas sempre estiveram brilhando nas galáxias científicas. Em todas! Faltava apenas um telescópio atualizadíssimo para que essa constelação de mulheres cientistas entrasse na rota de quem olha para o céu e para o futuro.

Não falta mais!

No próximo dia 11 de fevereiro, quando se comemora o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência (Decreto ONU, desde 2015), o Instituto Angelim fará o lançamento do livro e vídeo documentário Mulheres na Ciência em São Carlos: reflexões, trajetórias e histórias, no Teatro Municipal Alderico Vieira Perdigão, em São Carlos/SP, às 19h. Estão todos convidados.

A produção livro videodocumentário é uma homenagem à memória e trajetória de 6 mulheres cientistas de São Carlos/SP:  Cibele Saliba Rizek - Nas cidades, entre pessoas, muros, ruas e casas, histórias para se contar (Ciências Sociais); Lúcia Cavalcante de Albuquerque Willians - Construir laços sociais e superar a violência (Psicologia); Maria Aparecida de Moraes Silva  - Na terra, no campo, entre olhares (Ciências Sociais); Maria Aparecida Soares Ruas – O mundo não teria graça sem as singularidades (Matemática); Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva – Educação de qualidade para todos em todos os níveis (Ciências Humanas – Educação) e Yvonne Primerano Mascarenhas - A vida em um cristal (Físico-química).

“Decidimos iniciar o projeto com o levantamento de todas as pesquisadoras que se encontravam no caráter sênior, pesquisadoras aposentadas, mas que continuavam atuando em suas áreas temáticas e mais do que isso, que tivessem premiações e publicações internacionais e pesquisas relevantes que fazem parte do cotidiano da sociedade. Os bancos de dados do CNPq e CAPES que nos levaram a essas mulheres, em áreas diferentes do conhecimento e formação. Nossa ideia é continuar o projeto trazendo o percurso de outras mulheres na ciência em São Carlos”, explicou Mirlene Simões, idealizadora e organizadora do livro e videodocumentário. 

Esse telescópio vai mostrar nossas celebridades científicas principalmente para meninas e mulheres que possam se inspirar nessas vidas brilhantes. Assim, livro e vídeo têm edição, arte e recursos audiovisuais que transitam pelo universo do estudante do ensino médio. Foram desenvolvidos majoritariamente por mulheres, buscando dar visibilidade às cientistas e estimular a participação e formação da cultura da mulher na ciência. São Carlos denominada oficialmente como Capital da Ciência e Tecnologia, pouco reconhece publicamente as mulheres cientistas e pesquisadoras na cidade, pouco tem como memória e produção sobre suas trajetórias e trabalhos. Esse desconhecimento impacta diretamente o significado social dessas mulheres, o incentivo dado às jovens pesquisadoras, em início de carreira, e o desenvolvimento educativo de meninas e adolescentes no âmbito escolar. 

O relatório da Unesco - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, publicado em 2018, sobre “Mulheres na Ciência”, aponta que no Brasil entre 45,1% e 55% dos pesquisadores são mulheres e que entre as publicações científicas brasileiras as mulheres estão em 49% como “primeira autoria”, isso entre 2011 e 2015. 

É muito trabalho e muito sucesso.

O livro e o videodocumentário exploram os percursos e jornadas de mulheres que foram pioneiras em suas áreas para inspirar muitas gerações. Para tanto, o projeto foi aprovado no Programa de Ação Cultura – ProAC, mecanismo do governo paulista de incentivo fiscal para projetos culturais. Os livros serão distribuídos em escolas da rede pública de São Carlos acompanhados de rodas de conversas com os estudantes. Outra parceria foi com a Fundação Pró Memória de São Carlos com a impressão de exemplares do livro que serão entregues em escolas e instituições e personalidades que são agentes multiplicadores em frentes diversas da sociedade.

Festa homenagem de lançamento

A data para o lançamento não poderia ser mais significativa, Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, assim como o local, o palco do Teatro Municipal. Nele estarão nessa grande festa artistas da cidade, representantes do Ministério da Ciência e Tecnologia, PROAC, Secretaria de Cultura e Economia Criativa, Prefeitura Municipal de São Carlos. Será exibido um trailer do videodocumentário sobre essas mulheres galácticas que produziram e que são o motivo desse trabalho. 

Instituto Angelim

O Instituto Angelim, localizado em São Carlos-SP, tem suas diretrizes em comum com os objetivos do Desenvolvimento Sustentável ONU (agenda 2030). Seu propósito é promover de forma equilibrada o desenvolvimento econômico e social bem como reduzir a desigualdade em todas suas formas e valorizar a diversidade cultural e educação para a cidadania.

https://institutoangelim.org/

Stela Martins – assessoria de imprensa

MTb – 19.292/SP

(16)98845.5622

O futebol das mulheres ganha o planeta como nunca antes em sua história

Grande dia!
Grande dia de verdade e não o externado pelo boçal que ocupa desastradamente o posto mais alto do executivo brasileiro.

Hoje é um grande dia porque tem início a oitava edição da Copa do Mundo de Futebol Feminino! A anfitriã França abre a competição diante da Coréia do Sul a partir das 16h00 – horário de Brasília – e além da ansiedade pelo ponta pé deste jogo temos muito o que comemorar em termos de visibilidade.

Por Lu Castro, especial para o Barão de Itararé

Há pouco mais de dez anos, assumi uma responsabilidade pessoal: utilizar a tecnologia em favor da visibilidade das mulheres que faziam a bola rolar pelos campos da cidade. Minha primeira busca foi no Juventus, formador por excelência, e sua técnica Magali.

O material, publicado no antigo portal OléOlé, já se perdeu, mas, de lá para cá, perda deixou de ser sinônimo de mulher dentro e fora das quatro linhas.

Avançamos. E os contatos com os principais agentes da modalidade se intensificaram. E espaços alternativos começaram a surgir com mais força na busca pelo tratamento igualitário do futebol de mulheres e homens – ao menos no que diz respeito ao que se noticia, inicialmente.

Observando a movimentação da imprensa nacional, noto um grande cuidado ao tratar do assunto, diferente de muitos outros anos. Acredito que esteja diretamente relacionado ao número de mulheres presentes em redações esportivas, algo que apontei como imprescindível para a melhora na comunicação do futebol de mulheres em mídias tradicionais.

Avançamos. E avançamos noutros tantos aspectos do futebol, inclusive na gestão, onde o trabalho realizado pela ex capitã da seleção, Aline Pellegrino, como diretora de futebol feminino da Federação Paulista de Futebol, tem ampliado os espaços para trabalhar as categorias de base.

Avançamos. A seleção brasileira tem uma estrutura que nunca teve. A seleção brasileira conta com uniforme próprio e não sobra do uniforme masculino. A seleção tem seus jogos transmitidos de modo inédito em tevê aberta de alcance nacional. A seleção só não tem uma coisa: técnico.

E isso, car@s, é algo que me preocupa tanto quanto me alegra: o fato de termos a Copa do Mundo mais noticiada de todos os tempos.

Diante de uma seleção nacional que caiu no ranking FIFA nos últimos anos, sob o comando de alguém que não tem perfil para comandar o selecionado nacional em nenhuma circunstância – e já o demonstrou em outras ocasiões - que carrega para a França nove derrotas consecutivas, minha expectativa é de termos que reforçar nosso discurso e argumentar como nunca que o que eles (os espectadores desconhecedores da realidade do futebol feminino) estão vendo não é bem isso.

Num momento, em que os olhos do mundo estão voltados para a amarelinha tão conceituada um dia, mostrar um jogo baseado apenas na garras das nossas habilidosas e talentosas atletas, tem sido o protagonista dos meus pesadelos.

Tudo o que lutamos para construir – atletas, gestores, comissões técnicas sérias, jornalistas interessados no assunto – pode sofrer um revés de opinião pública se o coletivo não estiver bem arrumado. E nós sabemos que não está.

Há poucas horas da abertura do mundial mais importante de todos os tempos, vou da euforia e ansiedade que mal me deixou dormir a testa constantemente franzida de preocupação.

Avancemos pois, nossas atletas se entregarão e é muito provável que nos jogos do Brasil o que avance é o nível da gengibrinha pra dar conta da montanha russa de emoções.

Uma mulher registra um boletim de ocorrência acusando um homem por estupro. Em depoimento, descreve que o parceiro teria ficado subitamente agressivo e usado da violência para praticar relação sexual sem seu consentimento. O laudo médico, anexado ao caso, apresenta sinais físicos de agressão e estresse pós-traumático. Em resposta, o homem acusado desmente a história publicamente, argumentando que o episódio não passou de “uma relação comum entre um homem e uma mulher”.

Por Mariana Pitasse, no Brasil de Fato

Esse poderia ser apenas mais um entre os cerca de 135 casos de estupro registrados por dia – que equivalem a cerca de 10% a 15% dos abusos que acontecem diariamente no Brasil, segundo levantamento do Atlas da Violência de 2018. Mas não é um episódio qualquer. O homem acusado é Neymar, um dos jogadores de futebol mais bem pagos do mundo. Por isso, o caso tomou as páginas dos jornais dentro e fora do Brasil nos últimos dias, com ampla repercussão nas redes sociais.

Após a denúncia registrada contra o jogador do Paris Saint-Germain na última sexta-feira (31), a acusadora foi exposta de diferentes formas – pela mídia comercial e pelo próprio Neymar. Para "sensibilizar" a opinião pública, o jogador postou um vídeo em suas contas do Instagram e do Facebook em que diz ser inocente. Ao tentar “comprovar” sua versão dos fatos, divulgou conversas que manteve com a mulher pelo Whatsapp, assim como fotos e vídeos íntimos da acusadora. A ação fez com que o jogador passasse a ser investigado também pelo vazamento de fotos íntimas.

A divulgação do conteúdo não foi um equívoco e, sim, uma escolha. Neymar preferiu cometer um crime virtual para tentar dialogar com pessoas que concordam com a ideia de que uma mulher que envia fotos íntimas pela internet é necessariamente "aproveitadora" e "interesseira".

O que está sendo ignorado nessa leitura rasa proposta pela defesa de Neymar é que a intimidade exposta para milhões de pessoas não diz nada sobre a acusação de estupro. Como lembra a antropóloga Débora Diniz, o que circula é a versão de um homem poderoso que se ancora em elementos do fascínio pelo sexo e na desqualificação fácil das mulheres vítimas de violência sexual. E essa é também a narrativa em que tem se amparado a cobertura da mídia comercial sobre o caso. Mesmo sem afirmar que estão assumindo uma posição, jornalistas passaram o recibo de que a acusadora está tentando se aproveitar do “menino” Neymar.

Entre as reportagens que tomaram conta do noticiário brasileiro nos últimos dias, a matéria Jornal Nacional – no dia seguinte à divulgação das conversas – foi a que mais repercutiu. Ela traz um panorama sobre o caso e ressalta o depoimento de um ex-advogado da mulher afirmando que o estupro não aconteceu. A reportagem também divulga o nome da nova advogada de defesa da mulher, ainda que ela não tenha dado autorização para isso, desrespeitando um princípio básico do jornalismo: a garantia de sigilo das fontes. Na mesma reportagem, sem mostrar as fotografias e vídeos do corpo da mulher, divulgados por Neymar, são expostas frases soltas da conversa em que o jogador aparece enredado em um jogo de sedução.

Em outra reportagem, desta vez publicada no Jornal de Brasília, a mulher tem a vida financeira e judicial revirada. O texto aponta que ela tem uma ação de despejo em seu nome, após três meses de aluguel atrasado, e que acumula dívidas. A reportagem também disponibiliza o nome completo da mulher e detalha suas contas a pagar.

A invasão de privacidade promovida por jornalistas com a justificativa de mostrar a “real versão dos fatos” não terminou por aí. Em reportagem publicada pelo jornal O Globo, a família da mulher é procurada e sua mãe é informada sobre o caso a partir da abordagem da repórter. Dias depois, uma matéria veiculada pelo portal UOL evidencia que o filho da mulher, de cinco anos, está sofrendo com chacotas na internet e na escola por conta da repercussão do caso.

Mais do que a intimidade revirada e exposta em fotos e vídeos íntimos e informações detalhadas sobre sua situação financeira, a mulher teve sua versão dos acontecimentos contestada a todo tempo, de forma pública, inclusive por seu ex-advogado. Mas isso não é levado em consideração, porque tudo parece legítimo quando a motivação é “dar o furo” de reportagem. Na lógica do jornalismo, é necessário apresentar respostas antes mesmo das investigações. Tudo isso com base na “isenção e na imparcialidade”, ainda que à serviço da versão do jogador milionário…

Neymar, por outro lado, segue a rotina de treinos, jogos e compromissos publicitários, blindado por seu estafe. A presença dele está confirmada no jogo amistoso do Brasil contra o Qatar nesta quarta-feira (5).

Paris Saint-Germain e Seleção Brasileira se esquivam de comentar o caso. Familiares e amigos se pronunciam publicamente garantindo que ele é inocente e vítima de uma armadilha. A preocupação maior parece vir dos patrocinadores: ao menos quatro das 10 marcas manifestaram incômodo com o caso, segundo levantamento da Folha.

Comprovada ou não a acusação, a sentença já está dada: a mulher é sempre a ponta vulnerável. Não à toa, segundo o Atlas da Violência, são cerca de 1300 estupros por dia no país – dos quais apenas 135 são notificados.

*Jornalista, editora do Brasil de Fato no Rio de Janeiro e doutoranda em Antropologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF).

Edição: Daniel Giovanaz